Drummond me deu a "Conclusão"


Cheguei num ponto da vida onde leio Drummond do lado de fora da Sala Minas Gerais, com todas as luzes vermelhas compondo a orquestra de cores da minha imaginação. Sabe-se lá como vim parar aqui. Diante de toda poesia que isso representa, recordo-me do Pena Pensante e no que ele se transformou ao longo dos anos. Na verdade, o correto seria: no que ele me transformou. De certo, em amante. Amante das palavras que muitas vezes intitulei desorientadas por não fazerem sentido quando lidas com a razão. Somente após abrir as portas da alma foi possível guiá-las por um rumo mais "orientado". Até elas se perderem, de novo. Mas vamos com calma.

O Pena Pensante começou como um diário de ideias, projetos, sonhos e inspirações. Somente depois ele se transformou em um site literário um tanto quanto — ou nem tanto — reconhecido. Parcerias editoriais vieram e ele se viu no auge de sua essência. "Viva a literatura!", bravejava em suas páginas indiretamente. Tiveram contos, fábulas e crônicas. Até curiosidades históricas. O site estava indo de vento em popa até que... Bem! Até que minha vida virou de cabeça para baixo. Quis me desligar de tudo e de todos, fechar-me em pensamentos e dar adeus às páginas. O ano era 2019 quando tudo mudou.

Entrei num convento de frades durante esse período para aprender a extrair da mística da terra o que extraia das páginas dos inúmeros exemplares resenhados. O Pena Pensante, então, entrou em esquecimento. O que antes pensava, deixou-se dormir; e quem antes voava com a mesma pena que escrevia, parou sobre o galho de um pequeno arbusto. Finalmente, quando minha fase franciscana acabou, já era tarde demais. Ninguém mais se lembrava do velho contador de histórias. Os textos escritos foram substituídos por vídeos e muitos outros nomes surgiram nesse interim.

O que era o tal Pena Pensante escrito por alguém de nome desconhecido? Apenas cinzas depois de um incêndio. Eu bem que tentei retirá-lo do limbo com meia dúzia de resenhas, mas todas escritas tão somente para mim. Não houve acessos. Depois passei a escrever reflexões mais apuradas e até desenhei uma suposta "caixa formadora de palavras" para dar vida ao que costumam chamar de inspiração. Relatei experiências de certos lugares marcantes onde caminhei, mas... Enfim, os anos dourados não voltaram. Os autores que antes me pediam por análises literárias esqueceram-se do meu nome, embora seus livros autografados continuam bem guardados na minha estante. Tudo se transformou em história, resumida em um capítulo da minha vida. Curto, porém marcante.

Se hoje escrevo este texto, não é para me queixar do que se perdeu no tempo. Na verdade, eu já não tenho a mesma garra de antes para divulgar textos em grupos e mais grupos de redes sociais, geradores de visitas superficiais com janelas fechadas do coração. A minha escrita não parou. Enveredou-se para "a caixa secreta de um escritor naufragado", e lá ela permanece escondida e verdadeira. Depois de um longo período de ego inflado, descobri que a arte de escrever é sobretudo para quem escreve. E isso fez toda diferença para mim. 

Por sorte, cheguei na fase leitor do coração, capaz de ler uma poesia em Belo Horizonte enquanto a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais ensaia a nona sinfonia de Beethoven. Percebo, porém, que tal poesia não se encontra somente nas palavras, mas também no contexto do leitor. Se Drummond me deu uma "conclusão" para terminar este texto, faço dela um nó para puxar comigo aquilo que aprendi com as palavras divulgadas no Pena Pensante durante todos esses anos: ter verdade na arte quer dizer, acima de tudo, ter verdade consigo mesmo.

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