Postagens

Mostrando postagens de 2020

Sumidouro: Ponte Seca (Quarta Parte)

Imagem
Espelhar na vivência toda a historicidade do arcabouço ostensivo presente em Sumidouro é conseguir enxergar além do que a visão pode mostrar; é viajar nas linhas do pensamento projetadas em meio à maestria da obra; é saber decifrar o enigma emocional contextualizado nas paisagens; é sentir na pele a transformação fugaz das épocas; é exercer o papel de aventureiro e mergulhar no oceano de incertezas; é entender que a vida não para e as obras do passado tomam outras interpretações com o passar do tempo.  Por mais que possamos sentir que temos o controle de nossas ações para traçarmos planos ao futuro, tudo não passa de uma ilusão projetada pelo lento caminhar das décadas. Quantos indivíduos pisaram nesta terra com o desejo de construir impérios e nada levaram senão o esquecimento. Foram noites e noites depositadas na concretização de planos vazios, delineados pela vaidade, que acabaram encobertos pelo manto da noite escura. Caminhando por um centro histórico e observando atentamente os c

Sumidouro: Cascata Conde D'Eu (Terceira Parte)

Imagem
O relógio marcava mais de quatro horas quando adentrei o vale encantado de verde estonteante, mata fechada aos montes e riachos taciturnos correndo por entre as pedras. O sol ainda estava forte, mas já se preparava para o grande espetáculo de se pôr. Seus raios seguiam minha visão e dançavam pelos morros de pastos vicejantes. Àquela tarde o céu ganhava um azul único e a estrada de terra batida delineava seu percurso naquele esplendor natural que se revelava. O rumor da cascata monumental aumentava como se fosse uma lenda há muito esquecida. Um burburinho a cada curva enchia meu coração de esperança para avistá-la: a magnífica cachoeira e seu cenário hipnotizante, dona de antigas histórias cujas brumas guardavam uma relação encoberta com o romantismo no Brasil.  Tratava-se da maior queda d’água do estado do Rio de Janeiro. Um verdadeiro espetáculo da natureza vacilante ao vento, como um véu esbranquiçado pairando ao precipício. Foi em 1877, num almoço faustoso aos pés da cachoeira, quan

Sumidouro: Pedra Duas Irmãs (Segunda Parte)

Imagem
Quando trago à mente os exemplares de fantasia e ficção, cujos enredos me fazem viajar pelo imaginário da literatura, penso sempre no espaço e no tempo em que são colocados os personagens. Algo extremamente fantasioso que foge da realidade e vai ao encontro da magia, ou, melhor dizendo, da improbabilidade. Quando tiro o mundo literário de cena, onde tenho infinitas possibilidades de viagens dimensionais — espaço-tempo —, pouco me resta senão pensar em portais capazes de transportar seres para lugares inimagináveis.  Um portal pode se consolidar de várias formas e, também, pode ter vários objetivos, não se resumindo apenas a viagens dimensionais como nos mostra a fantasia. Pode significar renovação e recomeço. Ultrapassar um portal é sempre um ritual a quem leva dentro de si a mística da terra e o desejo de transformação. Algo relacionado à evolução espiritual para os teístas e amantes das forças da natureza. E, ainda para os mais céticos, os portais também são um mistério; uma junção d

Sumidouro: Um Lugar de Encanto e Magia (Primeira Parte)

Imagem
Sempre me atraí pela magia dos lugares. Por sua excentricidade; originalidade; singularidade; efeito de estontear; maravilhar; emocionar e, é claro, pela forma com que o cenário ilustra minha imaginação, fazendo-me delinear histórias pelo ambiente, como se o passado voltasse à tona no espaço circundante para se mostrar vivo à minha frente. Trabalho criativo para quem enxerga além do que vê. Afinal de contas, todos os lugares carregam consigo uma história oculta, um passado remoto, uma magia avassaladora e um enigma a ser decifrado.  Poderia estar traçando rotas e compartilhando facilidades do entorno — dando dicas para um passeio confortável e lugares onde se pode comprar uma boa refeição. Mas isso todos os guias turísticos já fazem. Não quero ser mais uma numa multidão. Escrevo para ávidos leitores, amantes da literatura e aventureiros de textos perdidos, e assim como ponho sentimentos nas resenhas literárias que teço frequentemente, também pretendo trazer emoção às viagens que compa

A Volta ao Mundo em 80 dias, de Júlio Verne

Imagem
De acordo com a etimologia da palavra aventura, do latim "ad venture", diz respeito, literalmente, àquilo que vem pela frente. Ou seja, encarar uma aventura significa estar preparado para o que vier; seja uma circunstância ou um lance acidental inesperado, sempre despertará emoções à flor da pele, fazendo dos aventureiros descobridores de si mesmos quando encontram em seu entorno o que não encontrariam em seu cotidiano. De tal modo, a aventura está diretamente ligada à quebra do habitual, partindo do ordinário e indo ao encontro do extraordinário. Esse conceito delineia perfeitamente a obra de Júlio Verne, A Volta ao Mundo em 80 Dias, nos moldes da narrativa fantástica. O escritor francês, tido como precursor da moderna ficção científica, teve como grandes expedições aventureiras os principais temas de seus livros, fazendo com maestria o que ninguém havia feito até então. A obra vanguardista aqui comentada não envereda-se tanto fora da realidade, como outros títulos do autor,

O Organista, por Filipe Penasso

Imagem
Molda-se em grandeza aquele que ao longo dos anos se vestiu de sublime encanto nas catedrais de pedra esculpida. Lá se destacava em proeminência o instrumento que invadia o íntimo dos aflitos colhedores de esperança em palavras de alento. Mas nenhuma palavra se comparava ao órgão que dominava o vento, transformando-o em notas musicais ecoadas em seus tubos de metal polido.  Mágica transmutada em música. Era como se as virtudes cantassem junto às vozes do coro enlaçadas pelos dedos e pés do organista, regendo seus instintos triunfante. Sois tal o dominador da esfinge viva? Enigma aos olhares curiosos que buscam entender como dali pode sair tamanha harmonia. De fato, valeu à história dar-lhe o epiteto de rei dos instrumentos, pois soberano preserva a arte em seu emaranhado de caixas, canos, tubos, teclas, ripas e cordas.  Obra escultural de onde o organista faz estremecer como uma tempestade as melodias da alma, refletidas pelo respeito, pelo tributo, pela emoção de sentar-se ali até que

O Amigo Dedicado: A Ilusão de Promessas Vazias

Imagem
A vida é, de fato, cruel quando se pratica a bondade em meio à ingratidão. É como plantar em solo infértil; ainda que a expectativa seja de exuberantes flores ao final, nada nascerá das rachaduras ressecadas e esquecidas pela chuva primaveril. Oscar Wilde soube ilustrar esta problemática em seu conto, fazendo-nos refletir a respeito da amizade lesiva, quando o lado mais forte tira proveito do mais fraco. O Amigo Dedicado é uma fonte de reflexão social, e, ainda que escrito há mais de cem anos, nos mostra de forma atual como seres maliciosos e egoístas conseguem crescer às custas da ingenuidade e inocência dos que não semeiam rancor em seus corações. Hans, tido como protagonista, só queria cuidar do seu jardim com amor, cultivando as flores mais belas com todo sentimento que tinha dentro de si. O pobre homem conseguia tirar da terra o seu sustendo durante o verão, a primavera e o outono. Contudo, o inverno se fazia muito rigoroso para ele, tendo de enfrentar momentos muito difíceis de f

Cultura Organizacional: Edgar Schein e Geert Hofstede

Imagem
Para Schein:   “Modelo (padrão) de pressupostos compartilhados, que um grupo assimilou na medida em que resolveu os seus problemas de adaptação externa e integração interna e que, por ter sido suficientemente eficaz, foi considerado válido e repassado (ensinado) aos demais membros (novatos) como a maneira correta de perceber, pensar e sentir em relação àqueles problemas.” Para Hofstede:   “Programação coletiva da mente que distingue os membros de um grupo dos de outro.” A premissa de Edgar Schein afirma todo grupo social precisa resolver dois problemas principais: convivência de seus integrantes e adaptação ao mundo exterior. Já a de Geert Hofstede, existe um padrão de crenças e valores compartilhados que ajuda os indivíduos a compreender o funcionamento organizacional. Este mesmo padrão proporciona aos membros certas normas de comportamento a serem seguidas, e a cultura é manifestada por meio de símbolos, heróis e rituais. Elementos da Cultura Organizacional, segundo Edgar Schein: Ar

O Rouxinol e a Rosa: Um Contraste Material e Sentimental

Imagem
Debrucei-me na janela literária de Oscar Wild e pude contemplar o vasto campo emocional de suas palavras. Não pretendo fazer uma análise ou resenha da obra por ora, mas uma simples reflexão contrastada nos valores contidos no conto, bem como a moral extraída de matizes emocionais gotejados pela melancolia eterna de clássicas tragédias.  Atentemo-nos ao resumo: um homem convida uma senhorita ao baile. A mesma diz que só aceitaria se o cavalheiro lhe trouxesse uma rosa vermelha. Tomado de tamanho êxtase, o personagem sai cantarolando pelas ruas na esperança de encontrar a rubra flor em seu jardim para entregá-la a donzela. O mesmo então é surpreendido ao chegar em casa e perceber que em meio às inúmeras roseiras nenhuma se faz de rosas vermelhas.  Por conseguinte, o rapaz entra em profunda tristeza. Assim, o autor nos introduz a parte lúdica e extraordinária da narrativa. Um rouxinol que voava pelas redondezas emanando alegria por onde passava presencia todo o ocorrido e se comove com o

Sal, de Letícia Wierzchowski

Imagem
Contrastada ao o nome minimalista, Sal, a obra envereda-se pelas profundezas oceânicas de romances proibidos e aventuras avassaladoras, enraizando emoções em solos inexplorados aos leitores ansiosos por saberem o desfecho da trama. Encarar as páginas do livro de Wierzchowski é como navegar por águas turbulentas, desenvolvendo o desejo voraz de desvendar cada vez mais os mares das paixões descritas pela autora. E quantas são essas paixões... Latentes e esconsas, momentâneas e duradouras. Seja pelo cenário ou pelos personagens. Tudo se conecta com a maresia da história que engendra-se a partir da tradição familiar e do amor que move cada personagem ao seu caminho. A poesia em forma de narrativa tecida nos capítulos do livro circunda a ilha de La Duiva com seu farol de luz vacilante. A matriarca da família Godoy reflete sua solidão e tristeza pelas mãos de tecelã, recordando tempos distantes onde sua família estava reunida pela ilha e o farol era um colosso aos homens desorientados que na

O Legado do Inverno, de Filipe Penasso

Imagem
Contextos fabulísticos têm o poder de nos conduzir pelas veredas da realidade em meios reluzentes da fantasia. Estar em sintonia com a literatura diz respeito entender a proposta ilustrativa, que condiciona o tema ao nosso cotidiano, fazendo-nos experienciar na pele o que as fábulas nos oferecem. Dito isto, O Legado do Inverno enlaça paixão e sonho em cenários extremos, permitindo-nos vivenciar o sentimento mais profundo da alma contraposto ao desejo mais ardente da mesma; em outras palavras, trata-se da ilustração comparativa que um desejo pode causar em nossas vidas quando não vivido em sintonia com os sentimentos que regem o mesmo. A estória caminha junto à paixão de duas aves diante da chegada do inverno: Beija-flor, senhor dos jardins e das flores, com o forte desejo de buscar o calor do sol em terras distantes; Pisco-de-peito-ruivo, graciosa cantante das cores do entardecer, com o objetivo de realizar seu sonho mais abrasador: entender os mistérios do inverno. Nesse jogo d