O Rouxinol e a Rosa: Um Contraste Material e Sentimental


Debrucei-me na janela literária de Oscar Wild e pude contemplar o vasto campo emocional de suas palavras. Não pretendo fazer uma análise ou resenha da obra por ora, mas uma simples reflexão contrastada nos valores contidos no conto, bem como a moral extraída de matizes emocionais gotejados pela melancolia eterna de clássicas tragédias. 

Atentemo-nos ao resumo: um homem convida uma senhorita ao baile. A mesma diz que só aceitaria se o cavalheiro lhe trouxesse uma rosa vermelha. Tomado de tamanho êxtase, o personagem sai cantarolando pelas ruas na esperança de encontrar a rubra flor em seu jardim para entregá-la a donzela. O mesmo então é surpreendido ao chegar em casa e perceber que em meio às inúmeras roseiras nenhuma se faz de rosas vermelhas. 

Por conseguinte, o rapaz entra em profunda tristeza. Assim, o autor nos introduz a parte lúdica e extraordinária da narrativa. Um rouxinol que voava pelas redondezas emanando alegria por onde passava presencia todo o ocorrido e se comove com o caso. A ave, famosa por unir corações apaixonados, tendo fama de cupido, não podia deixar o desespero consumir o pobre moço, partindo de jardim em jardim a procura da rosa vermelha.

Sem sucesso, o pássaro traça um diálogo com a roseira, implorando por transformar suas alvas flores em rubras carnais. Mas a roseira nada podia fazer sem o sacrifício do rouxinol. O mesmo então espetou seu pequeno coração em um espinho até que todo o seu sangue fosse sugado pela roseira. Daí, nasceu a rosa avermelhada.

O amante logo a encontra estonteante entre as outras rosas e parte a procura de sua amada. Nesse ponto do enredo surge uma das maiores frustrações literárias que já presenciei. A mulher o esnoba dizendo que outro homem havia lhe dado joias, e nada poderia ser melhor que isso. Desolado e inundado de profunda melancolia, o rapaz rejeitado deixa a rosa cair no chão e segue seu caminho tomado pela tristeza. E no chão a rosa fica, esquecida, até ser estraçalhada por pés e rodas desconhecidas.

Nunca ninguém descobriu o sacrifício do rouxinol por aquele amor perdido como areia no deserto. Apenas os dias se tornaram mais silenciosos, sem as melodias apaixonadas da pequena ave voando de galho em galho. O materialismo consumiu o sentimento mais precioso para nada receber; o amor se perdeu por entre as pedras das ruas, pisoteado por transeuntes.

O rouxinol cumpriu seu papel até o fim e deu seu sangue pelo amor. Mas os homens desacostumaram-se com tamanho sentimento e perderam o significado de sua importância. O amor deixou de ter seu valor, dando espaço a faustosos bailes, joias cintilantes e pessoas vazias dançando pelo salão. Ninguém era capaz de admirar o doce canto da ave todas as manhãs e a vida que passava diante de seus olhos. Eram iludidos por suas próprias vaidades. Bem fez o rouxinol que, mesmo no ápice da dor, morreu feliz com o espinho gravado no peito, pois sabia que o certo estava sendo concretizado e o amor estava prevalecendo nas batidas de seu coraçãozinho.

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